Anotações sobre o mundo do trabalho

Pra mim, o TRABALHO de maneira geral tem inibido a sociedade de se manifestar. Isso é uma crítica direta ao marxismo (talvez não a Marx) que por ora não tenho condições de desenvolver.


Atrelamos um sentido de satisfação e conquista “individual” tão forte através do trabalho, que ninguém consegue abrir mão, em maior ou menor grau, do seu quinhão. Ele se tornou o caminho único e mais fácil, por mais dolorido e insalubre que seja, tanto para o indivíduo dar seus passos quanto para a sociedade se manter de pé: arrastar grilhões pode ainda dar a sensação de força e liberdade.


Hoje todos sentem a necessidade de se manifestar para enfrentar uma espécie nociva de polvo político-econômico com múltiplos tentáculos, mas não sabem muito bem de onde tirar forças. “Como? Eu vou parar de fazer o que estou fazendo? Parar de trabalhar? Como? Se eu não cuidar do meu, quem vai? E os desempegrados?” – Sim, eles querem tomar exatamente o mesmo lugar que você está, porque… só há UM CAMINHO! – Isso não é desesperador? Parece que estamos hipotecados…


Quando problematizo o trabalho não quero me perder em devaneios sobre uma sociedade sem trabalho. Problematizo o modo de sociedade e de discurso hegemônico que o aliena e o transforma em engrenagem disfarçada de ideal, de dignidade, etc. Se o poder emana do povo (com todos os problemas que essa asserção pode ter), o trabalho também deveria emanar. Essa consciência, a polícia do trabalho (externa e interna) trabalha para inibir.

Convido quem mais quiser a pensar nessa inquietação meio atabalhoada. Em outro lugar, ao discutir opções de ação, expressei-me temporariamente convencido de que uma GREVE GERAL bem feita seria mais inteligente que medidas mais enérgicas. Mas a opção de greve geral me traz essas reflexões acerca do trabalho, não sei se úteis em termos práticos, enfim…

Há um importante pensador latino-americano de pseudônimo Don Ramon que teceu duas linhas geniais sobre o tema: “não há nada mais trabalhoso do que viver sem trabalhar”; e “o trabalho não é ruin, o ruin é ter que trabalhar”. “Nada mais trabalhoso”, no contexto, é geralmente entendido de forma moral, como se o trabalhoso de viver sem trabalhar fosse sinônimo de ignominioso, vergonhoso. Mas trabalhoso também pode ser compreendido justamente como pesaroso, opressivo, arbitrário, bem no sentido do “ter que” da segunda frase. Portanto, os pensamentos se complementam e feitos no registro da sitcom têm um potencial crítico muito mais agudo do que se fossem feitos numa assembléia sindical. Afinal de contas, Seu Madruga, um pioneiro do empreendedorismo, não lembra aquela bela imagem da Ideologia Alemã ao performar mil jobs diferentes sem ser escravizado por eles, enquanto ainda continua relegado à margem da sociedade? Essas frases ambíguas que ele declama como lições de vida não são o triste acting de uma existência cuja emancipação está restrita à autoironia? Não era sua marca registrada apanhar calado (e descontar no ainda mais fraco)?

* sem desconhecer a importância revolucionária do conceito de “ditadura do proletariado”, em tempos de “precariado”, já não sei se somos material para uma “classe trabalhadora”… Mas não custaria tentar.

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